eu tento me concentrar nas coisas boas. e, sim, eu preciso tirar desse ano uma lição. a lição final. eu fico em looping com dramas de amizade não é de hoje. é desde nova, desde criança. grandes perdas, grandes decepções. eu construo um mundo e vejo ele desabar. sempre foi assim. tem sido assim. 2010 concentrou esse tipo de acontecimento com carga extra de drama. acho que pra me ensinar. pra que 2011 comece mais leve. comece só com o que precise restar. o que não precisar, fica por aqui. junto com o ano mais dramático da minha vida, no que diz respeito a amizade.
tem essas duas pessoas oscilando aqui em mim. uma delas ainda constroi castelinhos, e universos, e mundos coloridos. e acha as pessoas incríveis, e se diverte, e abraça, e o coração é quente, e a vida é feliz. eu tive tudo isso esse ano. vi se aproximarem de mim as pessoas mais queridas. estive aberta a isso. a comunicação começa a não precisar de palavras. eu quero guardar todo mundo numa caixinha, dessas de guardados, de lembranças felizes, junto com fitas coloridas e papel de bala de frutas. a alegria é de verdade. o amor é do tipo mais puro. do tipo que dá vontade de chorar, só de pensar que está ali, que existe. e a gente se senta num banco de madeira tomando picolé, no meio da tarde, e gargalha alto. e eu me dou conta de que aquele ali, distraído, é um momento feliz. isso sou eu, repetindo o padrão, construindo castelos bonitos. enfeitando tudo colorido.
muito escondido, tipo uma sombra, discreta, essa outra pessoa me olha com desdém, e me pergunta até quando? até quando o coração vai encher desse jeito, quanto tempo até que você os decepcione, ou seja decepcionada? e essa pessoa me lembra de todos os escombros, dos castelos que foram construídos. as ruinas ali, me lembrando que às vezes sobra nada, ou sobra muito pouco. e as pessoas que um dia foram guardadas em potinhos foram perdidas, o mundo colorido esmaeceu, aquarelou, escorreu junto com a água da chuva. essa pessoa ainda se contorce de noite, quando ninguém pode ver. e vez por outra ela chora. e amaldiçoa o mundo, as boas intenções, e acha que nada pode dar certo, nunca. e eu me pego, influenciada por ela, achando que nada presta, e nem ninguém.
num espaço intermediário, todas as coisas que eu ainda não consigo catalogar. todas as relações machucadas. mas que o amor resiste. tem dessas também. os castelinhos que têm rachaduras. que precisam ser reformados, consertados, observados de perto e com cuidado. algumas paredes ruiram, outras persistem. eu não consigo destruir o que restou. fico olhando, meio sofrida, pensando no que ainda pode ser erguido, de volta, naqueles espaços vazios. eu comparo pessoas a construções, me chamem de louca. meus castelos foram surrados esse ano. uns ruiram rapidamente. desabaram como que feitos de areia pura. desmancharam no ar. outros bambearam, algumas paredes caíram. outras persistem, sabe se lá como, sabe-se lá por que.
eu entrei nesse looping, ontem, sem nem perceber. almoçando com dois queridos, desses castelinhos recém construídos, coloridos, firmes. e eu falava de como as pessoas são estragadas. fui corrigida. será que eu estou me tornando uma pessoa amarga, eu fico me perguntando. por que eu não consigo simplesmente me desvencilhar? porque precisa machucar tanto, toda vez? não é justo com quem chega, não é justo com quem persiste. e não é justo comigo, nunca, nunca.
então eu recomeço, do zero. a melhor forma de restaurar a fé é buscar onde ela é testada. e eu corri pra uma dessas pessoas. e passei horas e horas machucando e sendo machucada. porque machuca, quando a gente se importa. eu me importo. os meus castelos são meus. eu construí, e sim, eu posso me recusar a ver ruir. tem que ser assim. se não for, pra que serve isso tudo? tem que ser assim.
no final, o que resta é isso. é o que a gente constroi. é o que machuca, mas justamente por machucar, é o que deve ser mantido. porque se não machucasse, não era castelinho, não era mundo colorido. e eu fiquei ali. parede por parede, tijolo por tijolo. botando as coisas no lugar. onde elas deviam estar. estou bem esgotada. faltam ajustes. falta a massa, a tinta nas paredes. as novas flores nos jardins. abrir as janelas pra deixar entrar sol, de novo. pra renovar.
eu fico ouvindo que amizade deve ser leve. amizade, pra mim, nunca é leve. nada que tome meu coração é leve. nunca foi. nunca vai ser. alguns vão dizer que é drama. eu chamo de cor. eu pinto as coisas em volta com cores fortes. minhas cores são berrantes. meu castelos são coloridos. eu preciso descobrir um jeito de pegar essa pessoa que se ressentiu, e trancar ela num lugar onde ela só observe as coisas que deram certo. pra que ela acredite, de novo. e deixe de achar que as coisas não têm conserto. pra que ela acredite que não é sempre assim. que não precisa ser sempre assim.