terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

pequeno príncipe #fail

eu, ali, deitada no divã, meio desmontada em lágrimas, questionando a vida, os meus medos, as pessoas. tudo muito difícil, sempre, na vida em geral.

e freud me interrompeu. a voz meio ríspida, o tom de esporro. eu me calei. ela disse. esse troço de 'o pequeno príncipe', vou te contar. você não tem ideia do estrago que essa droga de pequeno príncipe fez.

e eu. comigo? com a vida em geral?

e ela. com a vida em geral. e com você. esse medo de magoar as pessoas, essa fragilidade ao ser magoada, esse peso, essa responsabilidade.

e eu pensei. toma essa, saint-exupèry.

freud continuou dizendo que essa porcaria de pequeno príncipe me estragou, que tudo o que eu faço é pensar no peso das coisas. na responsabilidade.

tu te tornas eternamente responsável pelo que cativas é o caralho. a boca suja é minha, só minha. boca suja de carioca. desculpaê.

e eu contei pra ela do meu post do pequeno príncipe, um que me doeu a vida escrever, mas que eu gosto tanto TANTO. a insistência de manter a porcaria da rosa amada na redoma. protegida, a salvo.

ninguém está a salvo. nunca.

ainda outro dia, o menino jornalista de covinhas e olhos verdes me perguntou, em tom de brincadeira, se corria algum risco, ficando por perto.

e quem não corre? eu respondi.

risco corremos todos. riscos corremos os dois.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

a vida pós terremoto

você sempre foi assim, agregadora? - me perguntou o menino jornalista, com olhos verdes e covinhas. 

primeiro eu respondi que não. eu sempre fui agregada, eu sempre me rodeei de amigos agregadores. eu sempre estive em casa de outros, jogada no sofá, gargalhando alto, jantando, contando histórias.

pensei melhor e corrigi. depois do último grande terremoto (chamemos assim as histórias tristes de quando o chão treme por debaixo dos pés e grandes fendas se abrem, engolindo pessoas e tudo que ali, um dia, existiu), pois então, depois do último grande terremoto, a casa ficou vazia, e eu nem sei direito como os amigos vieram. fato é que eles vieram, cada vez mais. no sofá roxo, na cozinha, jogados na minha cama discutindo amores e maquiagens, antes de sair para festas, depois de voltar das festas, tomando café da manhã. e os amigos de um universo ficaram amigos dos amigos de outros universos, e criaram universos só deles, que independiam de mim. e hoje o que eu vejo é uma grande rede de gente que se gosta, que se quer bem, que descobre afinidades, que discute pra caralho, que chora, que briga, mas que não questiona nem por um segundo o que liga um ao outro, ou todos eles a mim.

sim, eu sou agregadora. talvez eu nunca tivesse precisado ser, talvez eu tenha sido preguiçosa deixando o trabalho para os outros, ou a bagunça que fica quando as portas se fecham. talvez eu tenha deixado esse trabalho para os outros, até um tempo atrás. mas quando foi hora - e que bom que essa hora chegou - a casa cheia era a minha, o sofá cheio de queridos era o meu. é o meu.

e que continue assim.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

é tanto trabalho, e tanta coisa acontecendo, e a cabeça vai dando voltas e criando nós, os mesmos de sempre, aqueles que eu já sei que não existem, mas que eu crio, e aperto, e faço ficarem doídos. e, em estando doídos, e apertados, eu não consigo desfazer, e eu entro num universo que é só meu. e que me protege. ou que pelo menos me dá a falsa sensação de proteção. e eu me martirizo, e sofro, e choro. e, no fim das contas, eu só fico mais vulnerável, mais desprotegida. e maldigo tudo o que eu sei que só existe na minha cabeça, mas que eu vejo tão nítido, tão claramente desenhado.

toda a terapia do mundo não vai curar meus issues com pessoas. não vai.

andei estragada demais. antes de ser atacada eu ataco, antes de ser afastada eu me afasto. e sou eu quem aperta os botões, quem explode a bomba, quem toma o veneno. tudo isso porque eu não aguento. o peso do mundo, das pessoas, das relações, o fato de começar a perceber que eu me importo. me importar é sempre o começo do caos, o começo do fim.

ser blasé tem sido uma resolução extremamente difícil de cumprir. venho falhando miseravelmente.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

enquanto ele escreve, eu emudeço.

eu. que sempre escrevi.


ontem

fui trabalhar com a minha camiseta de esqueleto. um protesto silencioso. 

no meio da reunião, o menino mais bonito do mundo fixa o olhar no desenho, escondido embaixo da pashmina. eu pergunto o que ele tanto olha. Ele me pergunta de volta, o que é o desenho na minha camis... Eu afasto o lenço, pra que ele veja bem grande, o esqueleto. Ele fala. Mas então era um esqueleto mesmo. Eu esperava, hum, algo mais feminino.

É o que tem pra hoje, eu digo, com um sorrisinho irônicoslashamargo.  Complemento dizendo que amanhã - hoje - eu viria trabalhar com a camiseta de Zombie Audrey. Porque era o que teria pra amanhã. Ele sorri. A reunião continua. Assunto encerrado.

Nem usei a camiseta de zombie. Botei meu vestido listrado. E batom vermelho. E um sorriso.

porque pra hoje, well, tinha algo mais feminino, e menos revoltado. :)

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

minha lembrança mais nítida do ballet foi o primeiro dia. eu e carla, minha amiga de infância, sendo puxadas pela babá, levadas para a primeira aula. o professor era homem, o que fazia a gente soltar risadinhas. eu e ela, roupas iguais. meia calça cor de rosa, sapatilhas cor de rosa, com elásticos costurados para que não escapassem dos pés. collants cor de rosa com sainha. o cabelo preso num coque daqueles que só minha avó,sabia fazer. ainda sinto o cheiro do laquê, puxando a franja pra trás. redinha cor de rosa, arrematada com uma faixa. adivinha a cor?

carla olhou pra mim e disse. se o professor for bonito, vamos namorar com ele? tínhamos 5, 6 anos, eu acho. eu sorri e concordei. e ficamos ali, sentadas, esperando a porta se abrir.

quando a porta se abriu, surgiu um homem alto e magro, muito magro. levemente calvo, duas grandes entradas na testa, cabelo comprido, preso em um rabo de cavalo. usando um collant. será que é assim que se escreve? o peito meio de fora, o collant apertado. daniel, espanhol, sotaque e cavanhaque. feio. eu e carla nos entreolhamos e fizemos uma careta, e desistimos, ali, de namorar o professor de ballet.

eu era distraída, e nunca aprendia os exercícios. não por não saber fazê-los. por falta de atenção, mesmo. ele explicava elevés e pliés, eu olhava pela janela e gritava para as outras meninas virem ver alguma coisa - qualquer coisa - divertida lá fora. eu me lembro de olhar as bailarinas mais velhas quase que com devoção. tão lindas com suas sapatilhas de ponta. passando os pés na caixa de cal, envolvendo os dedos meio machucados com esparadrapo. eu queria ser como elas. mas me faltava atenção.

professor daniel era rígido. uma vez eu me lembro que íamos apresentar "sinfonia aquática" no final do ano. ele chamou todas as meninas mais gordinhas e passou um sermão. se não emagrecessem, representariam as pedras do cenário. comigo, as broncas eram todas pela falta de atenção. uma vez minha mãe foi me buscar na aula, e eu me lembro de vê-lo puxar o braço dela, olhar pra mim com dureza, e dizer: sua filha é a minha maior decepção. ela tem a melhor ponta de pé do meu ballet, mas é incapaz de se deixar transformar em uma boa bailarina.

meu problema era bem esse, mesmo. a falta de disciplina, de foco, de entendimento que, ali, eu podia ter começado toda uma história. não como bailarina. meus 1,74 jamais me permitiriam a leveza necessária. mas eu traria comigo a disciplina, a postura, o alongamento, o pescoço alongado que eu acho tão lindo. e a justificativa perfeita para os meus pés tão feios.

carla e eu nos perdemos, pelos caminhos da vida. sei dela pelo facebook, e não temos mais absolutamente nada em comum.

eu não sei que fim professor daniel levou. eu precisaria do sobrenome pra dar continuidade às investigações.

eu continuo desajeitada, indisciplinada, distraída, com uma postura ruim. mas com uma ponta de pé de fazer inveja a muita bailarina por aí.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

nenhum joão vem desacompanhado, me disse o menino, emendando com seu segundo nome o raciocínio. sei bem disso. sou filha e irmã de joões, cada qual com seu nome que segue. fiquei pensando em algum joão que eu tenha conhecido, que tenha sido assim, só joão. até o menino jornalista da firma colorida tinha nome duplo. mas só que o dele não era joão.

esse joão era meio bobo, mas não de um jeito ruim. eu fico pensando até que ponto eu estou estragada pra vida. porque eu passei o tempo todo enquanto estávamos juntos meio que pensando que ele era um idiota e que aquilo não iria pra frente, anyway. porque eu não servia, ele não servia, ninguém serve. a gente fica atribuindo valor às pessoas. assim como nenhum joão é só joão, tem que ser algo mais, tem que vir acompanhado de um segundo nome cheio de pompa e circunstância. e eu passei o tempo todo pensando que aquele joão ali, adormecido, aquele joão não teria o meu telefone. eu não atribuiria a ele nenhum valor, nenhuma expectativa, nenhuma frustração. 


porque ele até pode ser joão alguma coisa, mas não pra mim. pra mim, aquele ali era joão ninguém.