terça-feira, 6 de março de 2007

O sábado de sol corria normalmente, com Madame Ç confortavelmente posta à sombra em ambiente refrigerado. Toca o telefone. Ana Luiza diz: "casa da Flávia, casa da Flávia, casa da Flávia". Desliga. Fazer o que? Obedeço. Casa da Flávia.

A casa da Flávia é o ponto de encontro do momento. Lá estão todas as pessoas. Todas as pessoas se conhecem. Por causa da Flávia. Por favor, antes que eu descambe para a minha teoria de que a Flávia liga qualquer pessoa do universo a qualquer pessoa do universo em até 6 graus de separação, lembrem-me das reais razões para esse post. Ah, sim, Maria Clara.

Maria Clara é uma adorável garotinha de 5 anos de idade. Uma criança comum à primeira vista, que chegou acompanhada da irmã mais velha e do primo (nosso amigo em dia de "eu sou legal"), para um refrescante banho de piscina na casa de Flávia, naquele sábado ensolarado. Biquini, rabo de cavalo, uma mini canga, tamanho mini mesmo, de criança. Fófi.

O que primeiro me chamou atenção, lá onde eu me escondia, na sombra com meu copo de coca-cola gelada, é que Maria Clara tinha uma cor linda de cabelo. Meio dourada, de sol mesmo. Cachinhos, uma graça. Se jogou na piscina, fez borbulhas, bateu os pezinhos.

Crianças, para mim, fazem parte de um mundo muito peculiar, que não é o meu. Minha tese é que, como estamos impossibilitados de manter uma conversa minimamente coerente, o adulto que se dispuser a estabelecer contato - verbal, visual, o que seja - terá que lançar mão de suas qualidades de entertainer. Fazer piadas, dançar, cantar, distraí-las. Vale até aquela vozinha infantilizada que muito se vê por aí.

Acontece, senhores, que eu não sou uma entertainer, pelo menos não para crianças. Não sei contar piadas, não tenho as manhas da prática de amizade com seres tão pequenos. E vozinha infantilizada é algo fora de cogitação na minha vida. Logo, me afastei, e quando uma das duas adoráveis garotinhas olhava pra mim, assim, por acaso, me dispunha a dar um sorriso e sair de foco.

E algo inesperado aconteceu. Maria Clara resolveu conversar comigo, e eu, sem graça, acabei respondendo uma ou duas palavras. Perguntei o que ela queria ser quando crescesse e ela disparou: rainha de bateria. Uma criança de 5 anos, de mini canga, querendo ser rainha de bateria. Ela sabia de cór os sambas-enredo da unidos da Tijuca e da beija Flor, e quando eu pedi, inocentemente, que sambasse, não se fez de rogada: Bateu os pezinhos no chão, olhos brilhando, rebolando e girando. E devolveu: agora samba você.

Eu não sambo. Exceto em situações bizarras como a ida á Lapa, onde me dei por vencida. Maria Clara queria que eu sambasse, e nada fazia com que ela mudasse de idéia. Tentei distraí-la, falei que não sabia. Ela disse que me ensinava. Ofereci chiclete. De hortelã, cliclete de gente grande. Ela achou meu trident bem ardido, mas mastigou com força, olhou pra mim e disse: samba! E todo mundo concordou com ela, e é óbvio que eu não ia sambar. E ela não parava.

Maria Clara tem luzes no cabelo. Aquela cor dourada linda, que eu, inocente, achei que era efeito do sol, era química de salão. Ela riu alto e falou que tinha feito "mechas". E sambou, e disse que ia ser rainha da bateria. E comeu o meu trident de hortelã ardido sem reclamar. Maria Clara é a juventude emergente da Barra da Tijuca. Me convenceu a sambar, eu dei um ou dois pulos e ela gritou, maravilhada. Me adorou profundamente. É a primeira criança que vai com a minha cara. Na vida inteira, talvez. E isso é realmente importante, e eu quase acredito que sou alguém mais ou menos legal. No final do dia, já indo embora, tentou me jogar na piscina. Rá. Não deixei. Sabe como é. Tem que ter cuidado com essas crianças de hoje.

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