segunda-feira, 12 de março de 2007

A garota começa o assunto sobre simplicidade voluntária e me pergunta, no eme esse ene, se eu vi a matéria no fantástico. Vi, claro que vi. Fiquei com um pouco de pena daquelas pessoas aparentemente muito calmas e felizes, dizendo que estão aprendendo a viver com menos. Menos expectativas, menos agitação, menos dinheiro, menos sapatos. Menos sonhos, uma delas disse. E foi exatamente nessa parte do discurso que eu parei de olhar para a matéria com alguma curiosidade e comecei a prestar atenção com uma certa pena. Pena de gente que decide parar de sonhar. Se eu paro, é simples a equação, eu morro. Menos sapatos e bolsas me fariam sofrer horrores. Menos agitação seria bom, mas eu teria medo de emburrecer. Porque eu acho que a agitação é que treina o cérebro, de verdade. Faz com que o raciocínio seja rápido, que a gente reaja aos estímulos de forma mais adequada. Porque, fato, os estímulos são muitos.

Eu jamais poderia ser budista, por exemplo. Jamais. Eu sempre faço listas imaginárias de quais as coisas que eu deveria pegar e levar comigo em caso de incêndio no prédio. E ia dar muita coisa mesmo. Meu computador, por exemplo. Adoro. Meus cds, dvds, alguns livros. Meu casaco desconstruído de moleton, que é lindo, lindo, e que custou muitos dinheiros. Minha bolsa de cabrinhas e o vestido amarelo que me custou mais dinheiros ainda. Várias coisas. Uma vez, na faculdade, tentando achar a carteira para pagar o cookie que eu tinha comprado, achei o meu controle remoto da directv dentro da bolsa. Não sabia como ele tinha ido parar lá, na bolsa, em plena faculdade, mas fiquei um pouco feliz por ele estar ali, naquele momento, comigo. E eu sei que isso não faz o menor sentido.

Eu não consigo me desfazer de várias coisas, ela tem razão. Guardo roupas que eu amo e que ainda me vejo usando. Pra mim, às vezes, menos não é mais. Menos é menos mesmo. Ana Luiza está com meu livro "About a Boy" há quase um ano. É um dos meus livros mais queridos, que eu já teria relido se estivesse comigo. E que emprestei de coração (porque eu tenho defeitos, mas tenho coração bão), para que ela lesse e achasse a história foda e fofa, como eu achei. E que, eu sei, ela leu uma ou duas páginas e abandonou, na promessa de voltar. E ela não voltou. E ela não me devolveu. E o livro se mantém refém de uma pessoa desnaturada, que não liga a mínima para o buraco que se instalou no meu coração desde que eu deduzi que ela não estava lendo meu querido livro e que tampouco pretendia me devolver.

Então, esse negócio de viver a vida mais simples pode ser muito bonito, e tal, mas não me serve. Não sei viver com menos. Não consigo podar as minhas expectativas, não troco meu carro por ônibus, não consigo. Não quero pouco, quero muito, sempre. Muito das minhas coisas, muito dos meus amigos, muito do trabalho, das pessoas, de tudo. Tudo meu. Se eu tiver que podar meus sonhos, então, não gosto nem de pensar. Porque, nesse caso, eu, sem sapatos e bolsas, sem agitação, sem preocupações, sem expectativas ou sonhos, ia sentar e morrer. A equação é simples.

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