sexta-feira, 8 de abril de 2011

ensaio sobre a (minha) cegueira

depois de uma semana com uma enxaqueca insistente, numa quarta-feira o olho esquerdo amanheceu embaçado. fiquei preocupada. vista embaçada é coisa preocupante. comecei a achar o básico, que eu ia morrer.

nem ia.

a médica, uma oftalmo muito fofa e sorridente, que nem reclamou do meu atraso de 15 minutos, aceitando minha desculpa do transito (mas eu estava mesmo era distraída nos braços do namorado), me passou no primeiro aparelho, no segundo aparelho. olhava os papéis e me passava de novo. me mostrava ao longe as letrinhas diminuindo na projeção da parede. primeiro o olho esquerdo, já desembaçado, depois o direito. e eu lá. confundindo de leve Ds e Os, mas seguindo em frente, confiante.

e ela. você já passou no túnel? não, nem sei o que é isso. ah, mais um aparelho. mais um papelzinho para o qual ela olhava incrédula. e ela dizia. nenhum oftalmologista poderia errar tanto. contei a ela do meu abandono recente dos óculos, do incômodo em ajustar longe e perto. e ela conferindo papéis.

aparentemente, minha visão foi corrigida em mais de um grau no último ano. nos dois olhos. e toda a nitidez dos últimos tempos fez sentido. todo o incômodo e recusa em colocar os óculos. e ela lá. fofa e incrédula. me fazendo perguntas, examinando as lentes dos meus óculos. examinando meus olhos, again and again.

no fim, diagnóstico. eu preciso consultar um endócrino. porque nada na vida justifica tamanha correção de visão. aliás, uma coisa justifica. hormônio. tireóide. pescaram?

e eu me lembrei de todos os filmes assistidos pela metade nos últimos tempos, trocados por uma soneca comprida. me lembrei do frio que venho sentindo, do 1kg extra que eu vinha atribuindo ao namorado me obrigando a comer em horários normais, a toda a preguiça, cansaço, o sono. os olhos secos.

sim, sim. é possível que minha tireóide tenha resolvido mostrar personalidade, de novo. e eu estou aqui, analisando a vida.

acho curioso que a tireóide tenha me corrigido a visão, me feito enxergar tudo tão bem, tão nítido. tão dolorosamente nítido. e, ao mesmo tempo, tenha me colocado pra dormir, pra descansar, pra não querer sair de casa, encontrar pessoas, gastar energia.

enxergar muito nitidamente dá preguiça. preguiça do que se vê.

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