Se a minha cabeça funcionasse de forma mais simples, ah, seria tão melhor. Porque eu deveria agora, enquanto escrevo, estar arrumando a gaveta aqui ao meu lado, com papéis, documentos, caixinhas e fotos. Porque tem coisas ali que precisam ir comigo em viagem amanhã. Coisas que eu não sei onde estão e que, se estivesse arrumando a gaveta, como eu deveria, eu saberia. Eu tenho que tirar do chaveiro a chave do porta-correspondência, que fica na portaria, para o meu irmão poder pegar a conta da internet e a mensalidade do francês enquanto eu não estiver por aqui. Deveria recolher o material do francês, meus dicionários todos, pegar os cds que eu quero comigo, os dvds com seriados gravados, essas coisas. É muito tempo fora, penso. E se eu não levar alguma roupa que eu decida usar, tipo, na quarta feira? Mas como é que eu posso saber hoje, sábado, que roupa eu vou querer usar na quarta feira? Será que vai estar frio? A cidade siderúrgica é mais fria, e também mais poluída. Hum, preciso levar meu shampoo, o de pitanga. Secador de cabelo, vai que eu tenho um bad hair day? Maquiagem, casaquinhos, quero as minhas bolsas comigo, mesmo que lá eu decida passar a semana inteira usando só uma. Pijama. O pior é que é de lá que eu vou sair, na sexta feira que vem, pra visitar Madame T na selva de Pedra. Lá é mais frio ainda. Então, preciso levar um pijama menos quente para minha primeira parada, e um mais quente para a segunda. E se São Paulo for quente no verão? Não vou a SP há mais de 10 anos, minha memória só me traz a idéia de lugar frio, e com garoa, sei lá. Meu guarda chuva está na casa da Frá, há meses, porque aqui eu tenho carro e de carro eu não tomo chuva. Mas lá em SP pode ser que chova, e então eu estarei despreparada. E se fizer sol? Será que é um sol desses que deixa frio onde está sombra ou é tipo esse aqui do Rio, que queima a mufa em pleno inverno, hoje? Estou de camiseta, e agosto ainda nem terminou. Eu gosto de inverno, gosto de frio, andei comprando uns casaquinhos tão fofos, nem seria justo não poder usá-los na minha primeira ida a São Paulo depois de tanto tempo. Da última vez que eu estive em São Paulo, vejam só, ganhei do meu pai uma barbie, um livro dos contos de grimm, que tenho e adoro até hoje, e uma borracha amarela que virou de estimação, e que está, agora, no meu estojo do francês. Não sei bem como vou encarar a selva de pedra. Faz tanto tempo. Preciso levar calças e quero MUITO levar as botas novas. Uma marrom e uma preta. Não vão caber na mala, fato. E se estiver quente, com sol? Eu tenho que, para essa possibilidade, estar munida com sapatinhos fofos, sandálias, sei lá. Meus casacos amassam na mala. This sucks. Não tenho pijamas suficientemente quentes pra um frio desses. E são dois. Meias. Saias seriam uma opção. Mas aí eu precisaria levar sandálias que pudessem ser usadas com calças ou saias. Eu fico irritada porque ligo para a Madame e ela não atende. Deve estar na academia, a louca. Malhando num sábado. A Louca. Preciso saber do tempo, da previsão, do tipo de programa que ela planejou, pra saber o que eu levo, porque a mala tem que ser feita ainda hoje, e tem que servir para meus dois destinos, a cidade siderúrgica e São Paulo. E eu não sei o que levar. Que tipo de mala, se de rodinhas, se não. Levo toalhas? Toalhas ocupam TANTO espaço na mala. Preciso levar roupa de sair à noite? Existe roupa apropriada para HH em São Paulo? HH é happy hour, um apelido carinhoso que no rio não diz absolutamente nada. Saídas de fim de semana configuram hh, ou só quando é durante a semana, pra fugir do trânsito? Eu moro a 15 minutos do trabalho, nem sei o que é trânsito. Na cidade siderúrgica, 15 minutos é o que uma pessoa leva para ir de um extremo a outro, passando pelo centro, com todos os sinais fechados. Ou era. Faz tanto tempo. Nem sei.
Preciso saber o que vestir, o que levar. Preciso salvar os meus favoritos pra ter acesso aos blogs de outros computadores. Meu delicio.us está mais bagunçado que essa gaveta fechada aqui do lado, a que eu precisava arrumar. Tenho malas pra fazer, odeio tanto isso. Odeio fazer malas, pagaria alguém pra fazer por mim, juro. Quero ver televisão, comer pipoca e dormir um pouco. Mas tem as malas, e a bendita gaveta, céus.
Se a minha cabeça funcionasse de forma mais simples, seria tão melhor.