segunda-feira, 25 de junho de 2007

Carta aberta: Excelentíssima senhora J. K. Rowling.

Antes de começar essa carta, preciso informá-la: não li Harry Potter. Não li nem o livro um, nem o dois, nem o terceiro e nem nenhum dos outros. Claro que tem exemplares na minha casa, e confesso que nem é por implicância, é mais desinteresse mesmo. Tipo, o livro ta lá, uma hora dessas eu até podia escolhê-lo no meio dos outros. Cheguei a pensar em comprar os exemplares em inglês, pra treinar, não perder vocabulário, essas coisas. Mas acabei escolhendo os do Nick Hornby, muito legais, a senhora entende, né?

Bem, voltando ao Harry, eu levei a minha prima pra assistir o primeiro filme, e achei até bem engraçadinho. Tentei alugar o segundo em DVD, mas acabei dormindo naquela parte do carro que voa, chatérrima. Não me interessei pelos outros. Sei pela imprensa quando são lançados, esbarro em garotas de treze anos vestindo capas pelos corredores da Fnac. Tipo, eu até que não me incomodo com o fato de Harry Potter existir. Fico feliz que as pessoas fiquem felizes ao ler suas aventuras junto com a Hermione e o menino ruivinho que eu não lembro o nome, mas que parece bem legal.
Acontece que acabo de ficar sabendo de uma coisa e isso muito me preocupa. Como assim Harry vai morrer no próximo livro? Tipo, eu acreditava na senhora enquanto pessoa que só ganhava dinheiro como conseqüência pela boa ação de rechear o imaginário infantil (e, bem, alguns nem tão infantis assim) com histórias maravilhosas sobre um mundo de mágicas, feitiços e amizade verdadeira sobrepondo obstáculos. Pensava, essa senhora é legal, ela escreve bem, pensa com carinho em detalhes e aventuras e diverte criancinhas. Mas qual não foi a minha surpresa ao ver que o livro que está pra ser lançado, e que será o último da série, o oitavo, o nono, nem sei, vai matar o bruxinho com cicatriz na testa.

Sinto-me na obrigação de orientá-la, não como fã, mas como alguém que ama contos de fadas e histórias ditas infantis acima de muita coisa. Eu cresci com um livro de capa dura com todos, repito, TODOS, caixa alta, os Contos de Grimm embaixo do braço. Lia uma história por dia, duas. Explicava que a Madrasta tentou matar a Branca de Neve não uma, mas três vezes, e que a maçã foi apenas a tentativa que deu certo. Desfiava em detalhes as passagens onde as irmãs más da Cinderella decepam dedos do pé e partes do calcanhar para colocar seus pés no sapatinho de cristal. Mas NUNCA, em momento algum, os irmãos Grimm mataram uma princesa. Elas sempre viviam felizes para sempre, aprendiam com seus erros e encontravam os príncipes. O próprio Rumpelstiltskin só morreu porque se rasgou ao meio, porque ficou puto da princesa acertar o nome dele. Um suicídio, por assim dizer. E mesmo nesse momento, hum, dramático, os irmãos queridos Grimm arrumaram um jeito de fazer a morte ficar engraçadinha, já que a princesa ia ficar feliz para sempre.


Mas eu queria entender de onde foi que a senhora tirou a idéia insana de que matar o pobre Harry, já tão sofrido, órfão, com tios malvados e que finalmente está “se encontrando” na vida, pode ser legal. E as criancinhas, como ficam?

Eu sei que você, J.K., vai vir com aquela clássica desculpa de que é importante ensinar sobre morte and stuff aos pequenos. Que é superimportante aprender a lidar com perdas. Mas isso, dona Rowling, serve pra quando morre o vovô, a vovó, que ficaram velhinhos e foram morar lá no céu junto com o senhor Disus. Tudo bem. E, caso a senhora ainda não tenha notado, a parte da explicação cabe aos livros de auto-ajuda para pais. Nenhuma história infantil explica às crianças como lidar com o amiguinho que morreu porque fez uma travessura, ou ficou doente. Crianças não devem ser preparadas para a morte de outras crianças. Isso vai contra o natural, sei lá, aposto que um psicólogo vai saber te explicar isso melhor que eu. Deixa os pobrezinhos acreditando que o Harry existe, e que vai crescer, e que é feliz, ainda que não tenha mais livros continuando essa história. Como assim matar o Harry, dona escritora? Tudo bem que a história é sua, mas isso não é coisa que se faça, não senhora.

Os irmãos Grimm deixaram as princesas serem felizes para sempre, não deixaram? O Lewis Carrol botou a Alice nas maiores enrascadas, mas me diz se a rainha de copas cortou a cabeça dela no final, hein? Me diz? O Mowgli voltou para a cidade. Tistu, o menino do dedo verde também transformou Mirapólvora em Miraflores, e viveu feliz. A Rapunzel foi feliz, o Nemo foi feliz, Lilo e Stitch, felizes. Pegou?

Então, seja coerente com aquela senhora que se solidarizou com os pais de Madeleine ainda outro dia, e deixe o pobre Harry feliz, e vivo. Não tem sentido ser legal com os filhos desaparecidos dos outros e usar o seu próprio de mártir.

Sinceramente,
Madame Ç.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Prestem muita atenção na história que eu vou contar. É história triste, já adianto. Não que ela faça alguma diferença na vida de qualquer um que se disponha a ler este post, mas ela afeta a mim, sempre, pobrezinha, há, deixa ver, hum, 24 anos, com uma piora significativa há 21 anos.

Toda a paz que eu tive na minha vida acabou ainda antes dos 4 anos de idade, quando nasceu minha irmã. Eu não tinha pedido irmãos. Eu gostava de ser filha única. E ela veio, e eu fui convencida de que dividir os meus brinquedos com a minha irmãzinha era legal. Não era.

Tentei barganhar, pedi que fosse um menino, ao menos. Tarde demais, o bebê era menina. Ganhei uma boneca, daquelas de corpo de pano e cabeça, braços e pernas de plástico, sem cabelo, vestida de azul. Uma boneca menino, prêmio de consolação. Dei a ela o nome de Eduardo, e a vida seguiu. O tempo passou e eu ainda queria um irmão. E eu pedi por aquilo que, hoje, viria a se tornar a razão do meu desassossego.

Ele veio morar comigo há coisa de seis meses. Dividam o espaço, meus pais disseram. Ele usa o meu computador, rouba as minhas meias e enche de músicas o meu HD. Tudo bem, imaginava, não posso ser babaca e tomar dele o acesso ao único computador da casa, que por acaso é meu. E ele espalhou fotos, baixou programas. Diz que a música que eu ouço é um lixo, pede carona e usa meu shampoo de pitanga. Desaparece com a caixinha de fio dental, come o meu queijo cottage e faz a barba na pia. Tudo bem. Irmão, se não atrapalhar a vida da gente, é porque veio com defeito de fabricação.

Eu comprei uma escova de dentes novinha, lilás, pra substituir a minha. E ele me acorda assim: “Tata, joguei a minha escova velha fora e peguei aquela nova que estava na sua gaveta.” A minha escova, cuidadosamente escolhida, pronta para a substituição de praxe de cada 3 meses, o que seria exatamente aquela manhã. A manhã em que ele resolveu trocar a dele. Ele me chama de Tata, o larápio insensível.

Mas o pior é uma fixação absurda e inexplicável que o indivíduo tem com pilhas. Desde pequeno, ele rouba pilhas das gavetas, dos aparelhinhos espalhados pela casa, dos controles remotos. Um dia, meses atrás, depois de uma semana cansativa, num sábado de tarde, eu me sento no sofá e pego um dos muitos controles da casa, o que comanda a net. Achei o controle remoto leve, estranhei, e qual não foi a minha surpresa ao descobrir que ele estava com um imenso vazio onde deveriam estar as pilhas A3, que eu mesma reponho sempre. Nada. Ele estava viajando. Comprei mais pilhas, passei um senhor esporro, reclamei com pai, mãe, toda e qualquer autoridade que me veio à mente no desespero, ameacei tirar a mesada, o acesso ao computador, etc. E ele jurou que não faria de novo, mas é que por coincidência as pilhas do mp3 player dele eram daquele tamanho e o aparelhinho consumia mais energia que qualquer outra coisa. Eu fico me perguntando que espécie de lógica é essa que leva um homem feito com 21 anos nas costas achar que as pilhas de um controle remoto não estão em uso. Elas não estavam na gaveta, pelamordedeus, estavam no controle. O controle com pilhas serve para passar comandos à televisão. Que serve, por sua vez, para ser assistida, e tem especial utilidade em casa de Madame Ç.

Achei que ele tinha aprendido a lição, relaxei. Comprei pilhas novas, repus. Dois meses depois foi o controle do DVD Player que ficou leve. Ele, o irmão mau-elemento, novamente em viagem. Repetiu-se o ritual com o telefonema, os gritos, as ameaças, as reclamações com a mãe, depois com o pai, que garantiram um outro esporro daqueles. Comprei pilhas, repus. Ele nega até a morte a autoria desse delito específico. Mas moramos eu e ele, e eu sei que eu não fui. Whatever. Larápio.

E então, neste último fim de semana, novamente no sábado, pego eu o controle remoto da net, aquele vítima do primeiro roubo. Aperto os botões e nada acontece. Ué?! Leve ele não está. Viro o controle, abro a tampinha do compartimento de pilhas. Há pilhas. Pilhas velhas, descombinadas, inseridas – PASMEM – ao contrário. Tipo o positivo com o negativo. Tem um desenhinho em alto relevo explicando a posição, e ainda assim ele recolocou as pilhas ao contrário. Óbvio que elas não funcionavam. As pilhas que EU tinha comprado e reposto eram iguais, tipo da mesma marca e, importante, estavam na posição correta. Essas pilhas foram para o mp3 player do maluco, e ele me garantiu que elas também já acabaram. Liguei para o meu pai, uma última esperança pra que um outro esporro viesse e eu pudesse me sentir, de alguma forma, vingada. Meu pai, tadinho, aproveitou que o assunto veio à tona e disse que era pra eu avisar ao ladrãozinho que ele devolvesse as pilhas recarregáveis roubadas lá de casa no último fim de semana. E eu me sinto absolutamente desamparada, helpless, nas mãos de um maníaco ladrão de pilhas.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Quarta feira. Há tempos atrás esse seria um dia normal, comum, apenas ali, recheando a semana. Um dia sem graça, simplório, tacanho, medíocre e sem personalidade. Acontece. Mas aí chegou o estagiário insolente por aqui, provando por A mais B sua teoria de que as quartas feiras são dias amaldiçoados, do demo, que apenas existem para ferrar com a vida dos desavisados. E ele começou a me mostrar que as coisas bizarras, chatas pra caramba, sempre dão um jeito de acontecer, não na terça, não na quinta, mas na quarta. Sempre na quarta.

Eu fiquei doente numa quarta. Meu MBA dos infernos é sempre quarta e hoje, especialmente, é dia de uma prova absolutamente imbecil. Alguns feriados acontecem na quarta, só para que não seja possível emendar. Eu acordo, me arrumo, ponho minha sapatilha de bolinhas e, ao escovar os dentes antes de sair, sinto o pé meio gelado. Olho para baixo, estranho, meu pés estão molhados. O chão está molhado. A água pingava de dentro do armarinho da pia, ok, abro a porta e uma pequena cachoeira se forma, límpida. A fonte? O cano da pia, que o zelador do prédio - claramente mais bem informado que eu – não tardou a me apresentar. “É o rabicho, dona madame Ç. Só comprar outro que nóis troca pra sinhora.” Rabicho. Ok. Rabicho pra mim é diminutivo de rabo, um fiapinho no fim da coluna dorsal dos mamíferos. Mas, aparentemente, também se trata do cano maldito que pinga sem parar, agora, nesse exato momento, lá na pia do meu banheiro. Quarta feira, senhores.

quinta-feira, 7 de junho de 2007

Madame Ç foi abatida por uma gripe monstra. Ela vinha se gabando há meses, debochando dos combalidos, dizendo que não tinha nada de gripe "pra mais de dois anos", vejam só. Via os narizes que escorriam e falava que tem que comer direito e todas as outras coisas que ela não faz. E o irmão de Madame Ç trouxe o vírus maligno para dentro do calor do lar doce lar e ela se viu, anos depois do último embate, frente a tão horroroso e maligno vírus. Não fez nada, pra que fazer alguma coisa, dizem por aí que gripe com remédio cura em sete dias e sem remédio cura em uma semana. Confiou no sistema imunológico, em seu pequeno exército que não tardaria a rumar para, sei lá, os gânglios / QG principais, que se organizariam e resolveriam o "incômodo". Isso foi num domingo. Segunda passou, terça veio, quarta foi e quinta ela piorou. Providencialmente era dia do mba que não acaba nunca. Não vou, hehe, estou doente, boa desculpa, iaê. Foi pra casa, viu seriados, fez downloads, comeu frango agridoce e coca-cola de um suspeito China in Box. O irmão melhorou, viajou. Madame Ç piorou, mas foi trabalhar bonitinha. Chegou no ambiente gelado e avisou que estava morrendo. Ninguém acreditou. Ela queria mesmo era ser mandada pra casa pela chefa. Mas ela não se apiedou, e Madame Ç fungou, tossiu, espirrou, reclamou, chiou, tossiu mais um pouco. E foi pra casa no fim do dia. E matou aula de francês, e se entupiu - finalmente - com um naldecon noite. Arrastou-se pela casa com o edredon nas costas durante todo o sábado, tomou um daqueles banhos bem quentes de horas, achando que ajudava. Domingo parecia melhor, mas a outra segunda veio, e a garota estava - ainda - sem sinais de melhora. A cabeça latejante se juntou aos sintomas iniciais, a pele ficou mais quente que o normal. Toda a equipe havia sido contaminada na sexta feira última, aquela da piora. Todos tossiam e espirravam, e assoavam os narizes cheios de muco, e tossiam. Madame Ç ficou meio puta, porque os holofotes se dividiram e todos, agora, estavam sofrendo. Mas não pôde evitar um sorrisinho, daqueles de canto de boca, e dizer para a chefa que se ela tivesse tido a *decência* de me mandar pra casa naquela sexta feira fatídica, teria na segunda feira pessoas saudáveis na equipe. A culpa não era minha, vejam bem, era dela. Da chefa maligna, capitalista, que grita "foco" como chibatadas, mandando que as pessoas produzam. Que também estava gripada, hehe. E a garota tomou mais remédios, e dividiu suas vitaminas C efervescentes com seus co-workers. Na terça feira, o estagiário insolente sucumbiu. Todos os outros se mantiveram firmes em suas funções. E Madame chiava, e tossia, e espirrava, e maldizia o ar condicionado que até, em sinal de piedade, abrandou a geleira habitual. A quarta feira veio, e a garota resiste, combalida, meio morta meio viva, tentando obedecer a outra garota, que falou que é muita vergonha demais mesmo que ela deixe o blog assim, às moscas. Essa foi a gripe mais longa de todos os tempos. Está sendo.

Virá o feriado de corpus christi e eu só penso no meu corpus, dolorido, ferrado, sofrido.

Peço que elevem suas mentes e seus corações ao tal de Disus e façam uma prece por minha saúde. A física. A mental, não tem reza que conserte. Perguntem à outra Madame. Ela sabe.

(Se sobrar um restinho de tempo na prece, peçam por Paris, enjaulada, sofrida, sem Tinkerbell para praticar amizade e sem paparazzi. Paris precisa de nós.)